«Mas
quando ela desapareceu, a irmã deixou-se ficar ali sentada,
tranquilamente, de cabeça apoiada na mão, olhando o sol-poente e
pensando na pequena Alice e em todas as suas aventuras maravilhosas, até
que começou também a sonhar. (...)
Ali
ficou sentada, de olhos fechados. Quase acreditou no País das
Maravilhas, embora soubesse que, quando voltasse a abri-los, tudo
regressaria à enfadonha realidade... Apenas o vento faria sussurrar a
erva, e as águas do lago agitar-se-iam com o balouçar dos juncos... O
tilintar das chávenas transformar-se-ia no tinir dos chocalhos, e os
gritos estridentes da Rainha na voz do jovem pastor...
E
os espirros do bebé, o silvo do Grifo e todos os outros estranhos
ruídos dariam lugar (ela sabia-o) ao barulho confuso da azáfama que
reinava no pátio da quinta, enquanto os mugidos do gado à distância
substituiriam os soluços profundos da Falsa Tartaruga.
Por
fim, imaginou como esta sua irmãzinha seria no futuro, quando fosse
crescida; e como conservaria, já na idade madura, o coração simples e
adorável da sua infância, e reuniria à sua volta outras crianças, cujo
olhar se tornaria vivo e curioso ao ouvirem tantas histórias estranhas,
talvez mesmo a história do sonho do País das Maravilhas, de há muitos
anos; e como ela se sentiria no meio das suas tristezas simples e
encontraria prazer nas alegrias igualmente simples, ao recordar-se da
sua própria meninice e dos dias felizes de Verão.»
(Alice no País das Maravilhas é um dos livros que podemos integrar no que poderíamos chamar os Grandes Livros. Alice é a maior criação da literatura infantil, estando para lá dela. É um daqueles livros imortais, onde a cada frase as crianças perguntam porquê. Inspirada numa Alice que Carroll conheceu é um livro para alimentar toda a imaginação, onde vive uma Alice que nos deixa ser nós e os nossos snhos de aventuras).
Lewis Carroll, Alice no País das Maravilhas, págs. 125-126